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Caridade de Todos Nós

A conquista do bem-estar é quase que uma obrigação nossa, manter-nos bem, buscando constantemente em nossas vidas a alegria, satisfação íntima e realizações nos mais variados aspectos é condição sine qua non da caminhada rumo ao altíssimo.

Algumas vezes criamos pactos internos tão profundos conosco mesmos, e nos empenhamos unicamente nas próprias buscas, que não percebendo aqueles que ao nosso lado gritam por ajuda, vivem em conflitos, jogados como objetos sem valor. Essas pessoas podem estar enfrentando dificuldades muito mais intensas que as nossas, e nem nos apercebemos. Sendo assim, deixamos de ampará-las, por acreditarmos que, somente com a solução dos nossos desafios, é que nos tornaremos aptos para acudir os outros.

Nosso comportamento caridoso ainda não é algo espontâneo e natural em muitos de nós. Sê-lo, em determinadas circunstâncias, ainda nos causa certo desconforto. Quantas são as desculpas que produzimos para não nos envolvermos com o próximo: É a falta de tempo; de recursos financeiros; de jeito. Por outro lado, quantas são as situações em que nos cobramos uma atitude de maior solicitude? Quantas são as atenções que dispensamos justamente para abrandar nossas cobranças íntimas?

O Espírito Hammed ressalta:Muitas vezes, ‘doamos coisas’ ou ‘favorecemos criaturas’ a fim de proporcionar a nós mesmos, temporariamente, uma sensação de bem-estar, de poder íntimo ou de vaidade pessoal.

SANTO NETO, Francisco do Espírito; Espírito Hammed. Renovando Atitudes. Catanduva, SP: Boa Nova Editora. 2ª Edição. 1997. Capítulo: ‘Os olhos do amor’. Pág. 207.

Jesus, nosso Mestre e Amigo, ensinam-nos que, no ato de oferecimento, o que vale são as motivações e intenções que geram o comportamento. Podemos extrair essa belíssima lição no clássico exemplo da oferta da viúva pobre: A infeliz senhora ao colocar somente duas moedas no gazofilácio (local reservado às oferendas), diferentemente de outros que haviam colocado grandes quantias, faz com que o Cristo pronuncie aos seus discípulos: “Em verdade vos digo que esta viúva pobre depositou no gazofilácio mais do que fizeram todos os ofertantes. Porque todos eles ofertaram do que lhes sobrava; ela, porém, da sua pobreza deu tudo quanto possuía, todo o seu sustento.” (Marcos 12:41-44).

Temos ainda a equivocada visão que a caridade consiste basicamente em doar aquilo que não nos têm mais serventia e utilidade. Acreditando que esse gesto seja o suficiente para caracterizar-nos como pessoas caridosas.

Mas, muitos esquecemos que, a caridade é uma disposição íntima, ativa e dinâmica que se manifesta das mais variadas formas: em pensamentos de bondade, em conselhos úteis, em alimento e recursos na hora certa, em esforço no bem, e cooperação...

Tanto que, no Michaelis, sua definição é: “disposição favorável em relação a alguém em situação de inferioridade (física, moral, social etc.); compaixão, benevolência, piedade.”

MICHAELIS: Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. São Paulo: Cia. Melhoramentos. 1998.

O autêntico comportamento caridoso é aquele que não espera ou exige reconhecimento, gratidão ou qualquer tipo de recompensa. Pois ele se disponibiliza ao outro pela simples satisfação que isso lhe proporciona.

Nosso irmão Cairbar Schutel, Espírito, escreveu: “A caridade pressupõe necessariamente convívio. Afinal, caridade não é somente destinar verbas às obras filantrópicas, mas sim participar da vida em família, dos problemas dos semelhantes, das dificuldades dos necessitados, abrindo o coração para o mundo.”

GLASER, Abel; Espírito Cairbar Schutel. Fundamentos da Reforma Íntima. Matão, SP: Casa Editora “O Clarim”. 3ª Edição. 2000. Capítulo: ‘Caridade e isolamento’. Pág. 153. Item 870.

Já que, vivemos em comunidade faz parte da nossa caridade sermos integrados ao meio social em que nos encontramos.

Não há dúvida sobre a importância da doação de alimentos, de roupas e medicamentos, de quantias financeiras. São valiosos recursos para os que sofrem e se encontram em dificuldades. E como quase sempre, essas doações são portadoras de mensagens de socorro, de esperança, de alívio e conforto, muitos dos nossos irmãos conseguem recuperar a própria dignidade, encontrando, assim, motivações para continuarem acreditando e vivendo.  

Mas, perante os postulados espíritas, podemos afirmar que as doações de natureza material, muito embora importantíssimas em situações variadas, representam tão-somente a caridade em suas primeiras manifestações. Com o Espiritismo, a caridade abarca outros aspectos e opções, ampliando suas possibilidades.

Na questão 886, de O LIVRO DOS ESPÍRITOS, temos: “Qual o verdadeiro sentido da palavra caridade, como entendia Jesus”?

Resposta: “Benevolência para com todos, indulgência para com as imperfeições alheias, perdão das ofensas. A caridade, segundo Jesus, não está restrita à esmola. Ela abrange todas as relações que temos com os nossos semelhantes, quer sejam nossos inferiores, nossos iguais ou superiores. Ela nos ordena a indulgência porque nós mesmos temos necessidade dela.”

Ser benevolente é ter boa vontade para com os outros. É se deixar guiar pela amabilidade, pela generosidade e solidariedade, pelo interesse para com o bem estar do outro, indistintamente.

Como haver caridade sem boa vontade? Ou, segundo o próprio dicionário, sem essa ‘disposição favorável em relação a alguém’, principalmente quando ele se encontra em dificuldades?

Porém, nesta mesma definição, caridade é sinônimo de piedade. E segundo o entendimento do Espírito Michel: “O sentimento mais próprio para vos fazer progredir, domando vosso egoísmo e vosso orgulho, o que dispõe vossa alma à humildade, à beneficência e ao amor ao próximo é a piedade! Essa piedade que vos comove até as entranhas, diante dos sofrimentos dos vossos irmãos, que vos faz lhes estender mão segura e vos arranca lágrimas de simpatia.”

KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Araras: Ide Editora. 195ª Edição. 1996. Tradução: Salvador Gentile. Capítulo XIII. Item 17. Pág. 183-4.

Cada comportamento de benevolência tem a possibilidade de nos preencher com pensamentos nobres e sentimentos de compaixão e piedade. Por esse motivo que Kardec nos deixou a máxima “Fora da caridade não há salvação”. Ao praticarmos a caridade, na verdade estamos nos salvando, resgatando nossas mazelas pelo amor, como afirma Pedro em sua primeira epístola. Joanna de Angelis, Espírito, define ainda benevolência como “um sentimento de profundo amor pelo seu próximo, de compreensão pelos seus atos.”

FRANCO, Divaldo Pereira; Espírito Joanna de Ângelis. Diretrizes para o êxito. Salvador, BA: Livraria Espírita Alvorada. 2ª Edição. 2004. Capítulo 3: ‘Sublime ação. 27.

E é neste ponto que podemos destacar a indulgência: capacidade de aceitar e tolerar as atitudes alheias, julgando com bem menos severidade seus erros e equívocos. Mas isto se trata da caridade mais difícil de ser praticada, a caridade moral, porque simplesmente não sabemos lidar com as imperfeições alheias, compreendendo-as. Já havia dito Jesus: “E por que reparas tu no argueiro que está no olho do teu irmão, e não vês a trave que está no teu olho?” (Mateus 7: 3).

O Espírito Irmã Rosália enfatiza: “A caridade moral consiste em se suportar uns aos outros. (...) Há um grande mérito, crede-me, em saber se calar para deixar falar um mais tolo; e ainda aí está um gênero de caridade. Saber ser surdo quando uma palavra de zombaria escapa de uma boca habituada a escarnecer; não ver o sorriso de desdém que acolhe a vossa entrada entre pessoas que, frequentemente, erradamente, se crêem acima de vós, enquanto que, na vida espírita, a única real, estão algumas vezes bem longe disso; eis um mérito, não de humildade, mas de caridade; porque não anotar os erros de outrem é caridade moral.”

KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Araras: Ide Editora. 195ª Edição. 1996. Tradução: Salvador Gentile. Capítulo XIII. Item 9. Pág. 174.

E porque de nossa dificuldade perante os defeitos alheios? Na verdade, não sabemos entender e trabalhar as próprias deficiências. Então, é muito mais simples exaltar no outro aquilo que encontramos errado em nós mesmos.

Quando alguma situação nos exige o exercício dessa tolerância, a reação mais comum é nos aferrarmos aos próprios conceitos, concepções e melindres. Porém, quando nos conscientizamos do esforço que precisamos empreender para superar nossas limitações, nos habilitamos à compreensão da luta alheia. Quando nos percebemos na condição de aprendizes da vida, constatamos que o outro também o é.

Por fim, o terceiro aspecto da caridade na definição espírita: o perdão.

É um ponto delicadíssimo porque a maioria de nós ainda não consegue superar de maneira eficiente o próprio orgulho ferido. Por isso é que se diz que ‘perdoar é libertar-se’, ou seja, desvincular-se da raiva e do ressentimento que mentalmente nos prendem ao outro.

Na verdade, perdoar em uma concepção mais simples, é trabalharmos aquele sentimento contrário, de forma que ele não mais nos incomode, que não fiquemos remoendo lembranças, e alimentando ódios. Esquecer como muitos pregam é impossível, o pensamento é indelével, não se apaga nunca. Portanto, aprender a conviver com o fato, sem dor, e compreendendo que a pessoa que nos feriu é também um ser em evolução, e que como nós, pode sim errar. Somos seres falíveis, e não perfeitos!

A caridade do perdão é uma atitude que posiciona a pessoa que assim se comporta acima da média da sociedade contemporânea. Como enfatiza Joanna de Ângelis: “O perdão, por sua vez, é o auge das conquistas íntimas que desidentificam o ser das próprias imperfeições, porque se dá conta do quanto necessita ser perdoado, naquilo que se refere às próprias fraquezas e delitos que tem cometido.”

FRANCO, Divaldo Pereira; Espírito Joanna de Ângelis. Diretrizes para o êxito. Salvador, BA: Livraria Espírita Alvorada. 2ª Edição. 2004. Capítulo 3: ‘Sublime ação. 27.

Como salvar-se sem o trabalho construtivo no bem? Como poderíamos evoluir sozinhos, sem o próximo?

Somos seres interdependentes, DEUS já nos criou assim, justamente para seguirmos a estrada da evolução de mãos dadas. Sem essa aproximação, sem esse contato, sem a caridade humana, haveria somente a frieza, a indiferença, enfim, o intensificar das dores e problemas humanos.

No coloquial temos o seguinte pensamento: “As mãos que oferecem flores ficam perfumadas”.

A vida é assim: ela nos responde exatamente com aquilo que praticamos, ou seja, amando somos amados; doando recebemos; respeitando somos respeitados; ajudando somos ajudados; perdoando seremos perdoados. Mas se recebemos o bem na mesma proporção que oferecemos, é natural que isso também ocorra com o mal. Portanto, utilizamos essa inteligência que nosso PAI nos entregou, e daqui por diante levantemos a bandeira de Amor e Caridade defendida brilhantemente por nosso irmão Maior Jesus Cristo.

Um operário.

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